Encontro Marcado
Naquela manhã de sábado, 7 de junho de 2014, retornava a solo capixaba depois de rápido e desconfortável rodeio por uma vaquejada mineira sem ao menos ter conseguido sonhar, como sonhara, com a ronronante musa cafuza, nascida em Nanuque.
Confirmando a informação concedida pelos taquarinhenses (ou tricordianos?) pedalava agora tranquilo por uma rodovia pouco sinalizada, mas também pouco movimentada, e curta: Montanha estava mesmo logo ali.
Além disso, aquele rápido pedal matinal contou com um ingrediente que merece registro:
a maior extensão em linha reta que já percorrera nessas minhas idas e vindas ciclísticas:
foram mais de seis quilômetros, contabilizados a partir do momento em que me dei conta da singularidade geométrica do trecho.
Por aclives e declives que se sucediam retilíneos, pedalei por mais de uma légua sem visualizar qualquer aceno de curva.
Assim, acabei chegando a Montanha mais cedo do que previa.
Com evidente euforia.
Mas a cidade me recebeu com sabática indiferença.
Antes de procurar hospedagem fiquei, então, circulando à toa pela urbe distante: fui identificando, sem pressa, suas peças, sua constituição social, sua personalidade arquitetônica.
Montanha – constatei e sufraguei – se destaca com louvor no Concurso Nacional de Arquitetura Residencial Pequeno-burguesa-quase-rural, competição que, inspirado na cidade desatenta, acabara de criar, pra logo depois (ainda pedalando vadio por ruas vazias) cravar, a seu favor, meu voto de forasteiro.
E foi em meio àqueles palacetes anônimos – quase todos projetados entre o moderno e o modernoso – que localizei o que, involuntário, procurava: o discreto Teatro Municipal, onde aconteceria, às oito da noite, o meu encontro com Sérgio Sampaio.
Pois é: eu ia assistir ali ao show Sérgio Samba Sampaio, com o cantor paraibano radicado no Rio de Janeiro, Chico Salles.
Em verdade, eu não quis ver esse show quando de sua estreia capixaba no Theatro Carlos Gomes, em Vitória, no dia 20 de abril daquele ano.
Como assim? Você vem dizer que não quis ver um show só com músicas de Sérgio Sampaio, no Carlos Gomes?!
Pondero: é que esse show aconteceu uma semana depois da realização da oitava edição do Festival Sérgio Sampaio.
Sim, e daí?
Daí, que essa homenagem ao Velho bandido é uma iniciativa do Clube Capixaba do Vinil e eu fico envolvido com todo o processo de produção – amadora, por culpa minha – desse encontro de sampaiófilos.
Naquela oitava edição chegávamos ao melhor Festival da série iniciada em 2007.
(Contando com a boa vontade de Joelson Fernandes, então subsecretário de Cultura do Estado, trouxemos do Rio de Janeiro o filho de Sérgio, João Sampaio e o biógrafo do artista, Rodrigo Moreira.
Além disso, no encerramento daquela histórica edição uma garotada talentosa, sob a direção musical de André Prando e o comando de palco de Mariana Gotardo, apresentou, no Teatro Universitário da Ufes, no domingo, 13 de abril, o show Sampaiada capixaba, uma juvenil e graciosa exaltação à obra do poeta cachoeirense).
Assim, no domingo seguinte, dia do Sérgio Samba Sampaio, no Carlos Gomes, eu estava ainda me recuperando da ressaca física e, principalmente, emocional que se me acometeu depois que o bloco daquele ano concluiu sua festivalesca evolução.
Por isso – por conta desse fastio do espírito – não quis ir ao show no Carlos Gomes.
Mas logo depois, ao tomar conhecimento da circulação que Chico Salles e banda fariam por nosso estado, constatei (viva!) que poderia me recuperar desse desleixo, entrecruzando o meu Giro pelo Arco Norte com o último show daquela temporada, que aconteceria exatamente ali, naquela Montanha fronteiriça.
Por conta disso, estava circulando pelo platô que comporta a curiosa feição topográfica da cidade desdenhosa, onde ia cumprir o segundo – e último – compromisso do nosso Giro pelo Arco Norte.
A partir dali, posso garantir pra você, estaríamos, agora sim, prontos pro que desse e viesse.
Eu e ela, a intrépida magrela.
(Continua no próximo domingo)
Clique aqui para ouvir o álbum Sérgio Samba Sampaio
Crônica publicada originalmente no site Estação Capixaba. Fotos: Gilson Soares.
Gilson Soares é poeta.
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